Estávamos em 1973, Fui a Berlim Ocidental fazer um pequeno negócio. Os dias que passei na cidade foram mais do que tinha pensado e o tempo livre de espera era demasiado para o meu feitio.
Num desses dias em que me tinha levantado cedo e na rua, muito movimentada, começava a levar alguns encontrões, senti-me um empecilho. A cidade não é para passear, mas para trabalhar. Empurrado daqui e dali, sem sequer me dei conta que fui até ao muro de Berlim. Fronteira intransponível, nesse tempo, nem para Berlinenses de um lado e de outro e muito menos para um estrangeiro sem visto ou qualquer autorização. Mas para português perverter as regras é uma tentação irresistível. Foi assim com as descobertas, continua a ser ainda assim nos dias de hoje, quando só à força e contrariados colocam a máscara e cumprem as regras de proteção para não se contaminarem a eles e aos outros.
Perante a porta que ligava as fortes paredes do muro onde várias sentinelas, ao longo e no cimo do mesmo guardavam as duas cidades para não se contaminarem.
Não me contive. Toquei e entrei. Lá dentro, sala larga, balcão, de boa madeira, tinha uns cinco ou seis funcionários que instintivamente levantaram a cabeça. Ao guarda da casa que me atendeu expliquei-lhe que gostaria de entrar em Berlim Oriental para ver a cidade.
O homem pediu-me o visto, a autorização que eu não tinha e mais umas quantas perguntas. Com o meu passaporte na mão, disse-me para esperar sentado. Estive bem umas quatro a cinco horas, a olhar, não para as moscas, que não havia. Nem ruído.
Passei de uma cidade ruidosa para um silêncio profundo, que tanto as paredes como a porta eliminavam totalmente. Só não adormeci porque a minha cabeça funciona como bateria sem tempo. Sempre sequiosa de aprender mais.
Ao fim desse tempo tive permissão de entrar na cidade.
Espanto dos espantos. Não havia gente nas ruas. Dirigi-me ao local onde se encontravam dois táxis e perguntei onde podia encontrar um restaurante pois, não sei porquê senti uma fome imensa e rapidamente pensei em comer para melhor observar a seguir. Assim foi. Comi uma carne muito bem feita, uma boa salada de pepino e um sumo que me escolheram. Sei que em dinheiro português não me ficou a mais de seis escudos (hoje 3 cêntimos) em Berlim Ocidental nunca seria menos de quarenta escudos.
A cidade era espantosa. Tudo muito limpo, tudo muito arrumado, lojas impecáveis, povo amável, mas que mudava imediatamente de atitude, se dissesse algo sobre política.
Gostei da cidade, quase vazia de gente e de poluição, onde carros praticamente não existiam e apesar de estar quase ligada à sua meia metade, não lhe sofria as dores dos fumos.
Durante muito tempo pensei em Berlim Oriental e um grande desejo de aí viver, onde a limpeza era superior ou igual à da Holanda ou da Suíça e o barulho não existia.
Se não fosse casado e tivesse já filhos, tenho a certeza que não resistia. Esta força genética que nos empurra para a surpresa e para o infinito foi aquela que nos fez percorrer o mundo à procura da felicidade e do desconhecido.
Agora que não temos para onde nos alargar, façamos pois um pequeno esforço para, juntamente, com os outros povos, varrer o Covid, cumprindo regras, a menos que todos queiram ficar confinados em casa tal como estavam os de Berlim Oriental até à queda do muro.
Coloque a máscara. Não se zangue. Não vale a pena. Quanto mais se zangar, mais o Covid poderá saltar de um para outro até você se calar.
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C.S
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