Todas as vezes que ia a Alcongosta saborear a namorada e comer cerejas passava perto do seminário do Fundão onde Vergílio Ferreira conseguira soltar as amarras do pensamento e fugir da hipocrisia.
Eu tinha ido para o colégio do Fundão para fazer o sexto e sétimo ano. Felizmente que o diretor, o indiano Meneses, me expulsou caso contrário os braços da minha querida cerejinha fariam esquecer todos os bons propósitos de que estava imbuído. Assim tive de rumar a Castelo Branco, onde um ex-seminarista me deu, com tanta eficiência, lições de Latim e Grego que consegui, de uma assentada, acabar o ensino liceal.
Passados muitos anos e depois de já ter escrito o segundo livro sobre os casos extraordinários que aconteciam por intermédio do padre Miguel, quem vejo, na pequena aldeia de Meimão, para meu espanto e grande satisfação? O Vergílio Ferreira e a esposa.
A exuberante alegria do padre Miguel por me apresentar o grande amigo que desde os tempos de seminário nunca mais esqueceu, foi enorme.
E, cada um à compita, desfiou recordações. Vergílio Ferreira na sua natural frontalidade declarou-me:
- Quando li os seus dois livros sobre o Zé, não me admirei de que isso um dia pudesse acontecer e ele escandalizasse os “santos padres” com esta publicidade feita a um simples que tem o arrojo de fazer milagres.
O padre Miguel riu-se com o ar gaiato que o caraterizava e contesta:
- Deixa-te de exageros. Eu não faço nada. Não passo de um cano roto.
- Cala-te senão conto tudo. E não resistiu: sabe que este cavalheiro era o ai Jesus do seminário?
- O padre Miguel esconde os segredos.
- Pois fique a saber que já nesse tempo, este menino, curava qualquer maleita dos colegas e até dos professores. Bastava colocar as mãos sobre o órgão doente e daí a pouco o infeliz estava aos pulos. Um deles, hoje grande amigo do Zé Miguel tinha ataques de epilepsia. Mal lhe punha as mãos em cima aí estava ele de pé. Hoje, nem sinal da doença tem.
- Chega. – Disse o padre Miguel, pouco à vontade. Mas tu não contas as tuas habilidades futebolísticas. O lado onde estivesses ganhava sempre.
- Porque me resguardava das tuas caneladas.
Durante uma boa hora falámos de livros. Sobre os que escrevi, respeitantes ao padre Miguel e sobre os dele. Confessou:
- Você tem a coragem de descer à linguagem do povo para que a mensagem produza efeitos, mas temos de abdicar de muito para o fazer. Eu contínuo a procura tal como afirmei em “Manhã submersa”.
Saí do Seminário, como esperava, não sei se por ter ficado mutilado, se por enfim se reconhecer que eu não tinha “vocação”.
Em Lisboa voltei a encontrar o Virgílio, mas apareciam sempre conhecidos para quem a linguagem e o pensamento beirão não passavam de fenómenos estranhos, intragáveis para os citadinos da capital.
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